segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Vale Veneto - Um Pedaço da Itália no Brasil



....Uma história de coragem !!!

A viagem, juntamente com outros imigrantes, começou em Gemona Del Friuli, na provincia de Udine, Itália, região localizada muito próxima de Veneza(cerca de 100 kilometros) e junto da fronteira com a Austria, com chegada no porto do Rio de Janeiro  em 11 de janeiro de 1878. A Viagem durou cerca de 30 dias com o vapor Ester.
Angelo Paschoalin nasceu em  07 de março de 1849 e casou-se no Brasil, em Vale Veneto, com Catherina Pascuotini.
Do Rio de Janeiro, rumaram para Porto Alegre,  que na época era chamada de Porto dos Casais, fundada que foi pelos imigrantes oriundos da Ilha dos Açores. A viagem do Rio de Janeiro até Porto Alegre demorou em função de que os navios da época eram navios de carga e vinham parando em diversos portos na costa brasileira.
À descarga das bagagens, seguiu-se logo e reembarque em um vaporzinho fluvial, recomeçando a viagem Jacuí acima, até a antiga ponte que fazia a travessia da estrada de ferro.

As mudanças foram então acondicionadas em carretas de bois iniciando-se uma longa via-sacra. Mas somente no dia seguinte, começou-se a viagem. Os imigrantes levantavam muito cedo, não assim os carreteiros, que acordavam mais tarde. Acendiam o fogo e tomavam chimarrão. Os exiles (deportados) observavam e comentavam:-‘Varda lá, Che gusto! E Che pressa! I buta um poça de erba dentro duna succa, i tra acqua bointe, e i ciucia quel mesticro com um canette de lata... Cev’essa um gusto, nos?’ Depois recolhiam os numerosos bois, atrelavam-nos nas carretas, e iam então, tomar seu café... –‘Me vien sú is agrícoli a vede la pressa Che i gá!!!’ Criticavam, pois estavam mais que ansiosos para chegarem ao fim daquela aventura.
Rodavam então 2 horas antes do meio dia, paravam e ‘vá mate!’ quando faziam comida, botavam na panela um saco que parecia de couro, saco que fervia até tarde da noite, no outro dia, temperavam o feijão que comiam...
Durante a tarde avançavam mais algumas horas, e paravam, pois caía a noite. Os imigrantes retiravam então dos caixotes algumas cobertas e lençóis, armando uma barraca cada família. Quando o chão se encontrava encharcado, tinham que cortar galhos e colher capim para poderem arranjar algo, onde conciliar o sono. Assim foi toda a lenta caminhada que duraram 15 dias, ainda mais prejudicada com contínuas chuvaradas, de um e mais dias inteiros.
Com a demora do avanço, chegou a faltar comida:- ‘Adesso far cosa, Che mon si vede gnanca na casa?... Dio provvede enche per i ozéi’ – disse Francesco –‘proverá anche per noi’. De fato, quando amanheceu, ao galgarem (escalarem) uma coxilha, apareceu uma fazenda na seguinte... – ‘Demmo, lá in arquanti omini, cataremo qualche cosa’ -‘Ma come faremo, se moialtri no cappimo il brasilier, e lori noi capisce il Talián?’... Alguém com mais coragem tomou a frente, aparecendo o fazendeiro prevenido, com capangas. O grupo ergueu os braços, dizendo que tinham fome, e buscavam víveres, apontando o laranjal.
O senhor ordenou aos pretos que apanhassem as frutas, quantas quisessem, enchendo várias bolsas... Esfregaram então o indicador com polegar, e o proprietário fez sinal que nada deviam. Despediram-se com gestos de cabeça e apertando a mão benfazeja (saudavelmente). Desceram ao acampamento lá embaixo, na restinga, alcançando-o pelo meio dia. Que expectativa e que fome, meu Deus! Com laranjas se arranjaram por três dias e noites, paralisados aí pelas chuvas.

Na alvorada (nascer do sol) do terceiro dia, passou um cavaleiro que se dirigia a Vale Vêneto. Os carreteiros encarregaram-no de avisar Paolo Bortoluzzi, que vinha chegando nova leva (“remessa” de gente), que estavam na miséria, e que providenciasse algo para socorre-los. No dia seguinte, já volto, vieram duas pessoas, com dois cavalos com cargueiro e comida... -‘Benedetta Providenza Del Signor!’.
Combinaram com eles, que voltariam já no dia seguinte, levando consigo mulheres e crianças, enquanto os homens acompanhariam a mudança.
Quando esse grupo chegou a certa distância, vislumbrando os montes, disseram: -‘Varda come in América i mate via il fieno per varnar lê beste!’ Os guias lhes explicaram que eram picos da cordilheira montanhosa, onde iam parar. Anoitecia bastante, quando se aproximaram de uma sanga, pedregosa, cujas águas alentadas pelas chuvas murmuravam nos pedreiros. –‘Sinti che barúio... i ne dizêa próprio, che nel Brasil ghe gera bestie feroci... Ascolte che barúio che lê fá’ Os condutores aquietaram-nas dando-lhes a conhecer que o ruído era do cascatear da correnteza. Alcançaram enfim, “o paesello”, e todas com seus filhinhos, quiseram logo deitar.
Alguns dias depois, se ouviu também o rangido das carretas, cujos enormes xodados, chiavam agudamente de encontro ao volumoso eixo de madeira, falta de lubrificantes. Vinham chegando os trastes e os homens. O que provocou imensa alegria entre eles e no pessoal de Vale Vêneto, e voltou a ouvir-se o canto: “Che la vaga ban, che la vaga mal...” algo fatalista, bastante esperançoso, e a cruel realidade. Viesse o que viesse “Non si dá retorno in Pátria!”
Nova Via – Cruéis!... Uma manhã muito cedo partiu os homens, com um prático do caminho, que não existia, pois o que havia era somente campo e mato. Indicava: “Temos que passar naquelas árvores do capão, coxilha, baixada...” E assim por diante até Dona Francisca. Lá se pousava no duro assoalho, para no outro dia, penetrar na mataria adentro, até o destino. No mesmo dia retorno a Dona Francisca, “per dormir sul mundo terreno”, e com um terceiro lance atingir Vale Vêneto, já anoitecendo.
Ergueram tosco rancho (lote simples, grosseiro) comum onde parar, enquanto desbocavam alguma roça. Nelas, após a queima, construíram moradias para quem primeiro entrasse, para em seguida erigir outras casas para outras famílias. Aprontadas estas, já com uma primeira safra de subsistência à vista começaram as mudanças.
A gurizada não gostou por se verem ilhados na mata feraz (fértil). No entanto o fluxo imigratório continuava. Cheios de fé e esperança, enfrentando mais esta etapa, que no final contou até com um burro de carga, para transportar os últimos trastes. Então Dona Francisca e Novo Treviso, se formara um atoleiro no pique assombrado, bem, mas imediações de uma casa dum brasileiro. Lá de dentro veio gritando: “Não passem aí porque a besta atola!” olharam-se e disseram: “Mi no vedo tolls quá?” e a besta afundou até a barriga no lamaçal. O homem veio correndo para retirar a montaria capturada e impotente. Assustaram-se ainda mais, vendo o brasileiro correndo para eles. Mas ele, traquejando, cuidou de logo descarregar a basta para eles, e sacola do tremedal. Reposto o cargueiro, desaprovou: “Eu disse que ia atolar” “Si, si...” Agradeceram e partiram, comentando: “Bisogna cha stemo atenti: quando che i dize ‘attola’, voul dir, ohe se impianta sul barro”.
Nesta epopéia da mudança para os núcleos distantes e sem estradas, os objetivos mais pesados, como caixotes, eram amarrados com cordas, e inçados por uma vara, com dois homens carregando nos ombros em fila indiana, levando no transporte, até dois dias ou mais.
Vale Vêneto é um distrito localizado no município brasileiro de São João do Polêsine, no estado do Rio Grande do Sul. A origem de seu nome é uma homenagem aos colonizadores italianos que se fixaram em suas terras, cuja maioria provém da região do Vêneto[1].

O Governo Imperial de Dom Pedro II D’Alcântara, no ano de 1876, abria uma imigração gratuita pelas quase 22 províncias formadas no império do Brasil. Foi quando na Província de São Pedro do Rio Grande do Sul desenvolveu-se também a imigração em massa com a vinda de grande número de imigrantes para a região, atraídos pelo clima e fertilidade do solo. Para que isso acontecesse o Governo Imperial preparou quatro colônias, sendo elas: Conde D’Eu hoje Garibaldi, Dona Isabel hoje Bento Gonçalves, Fundos de Nova Palmira hoje Caxias do Sul e mais tarde Silveira Martins.
Então, do Norte da Itália, região do Vêneto, saíram os imigrantes que aqui chegaram e povoaram essa região. Os imigrantes partiram do Porto de Gênova, Itália, seguiram viajem até Porto Alegre, onde eram acomodados em galpões cobertos de zinco, na Praça da Harmonia. Daí saíram em pequenas embarcações subindo o Rio Jacuí aportando em Rio Pardo.
De Rio Pardo, os imigrantes prosseguiram viagem em carretas de bois até o Barracão de Val de Buia, em Silveira Martins. As mulheres, idosos e crianças juntamente com alguns pertences eram colocados nas carretas com coberturas de duas águas, feitas de macegas e ervas secas, couro de boi e zinco, os homens e jovens iam a pé. Passados quinze dias chegavam ao barracão.
As famílias que aqui se estabeleceram passaram por grandes dificuldades, para chegar até a sede, Barracão. De acordo com Sponchiado (1996), “pensar que a chegada na colônia representava o fim do sofrimento e peripécias é puro engano”. Os imigrantes tinham que explorar os montes, a cordilheira de São Martinho, em piquetes, pés descalços, pois não havia estradas.
Enquanto aguardavam a distribuição das terras, uma peste (epidemia), dizimou cerca de 400 pessoas. Segundo Sponchiado (1996) “com este fato o governo Imperial acelerou o processo das demarcações de terras devolutas”.
Transcorridos dias de permanência no barracão, partia-se para o Lote escolhido. “No Lote abria-se clareira o mais rápido possível e construía-se uma cabana de pau-a-pique, coberta com ramos de árvores. Era o primeiro abrigo da família e onde ia noite, ardia sempre o fogo para afugentar os animais ferozes e, no inverno, para aquecer os corpos.”(Lorenzatto, 1999, p.129)
O contínuo movimento de imigrantes fez com que a Quarta Colônia de Imigração Italiana, Silveira Martins, se expandisse pelos contra fortes da serra de São Martinho.
Foi então, que em 20 de maio de 1878, chegavam os primeiros imigrantes na Localidade que então era conhecida como "Buraco" por sua localização no vale. Eram onze famílias no total. No mesmo ano, chegavam no vale mais famílias lideradas por Paulo Bortoluzzi. Por ser uma família numerosa o nome do local passa-se a chamar Vale dos Boroluzzi. O grupo dos Bortoluzzi, tinham uma situação financeira privilegiada perante os demais imigrantes que os acompanhavam e, por isso, puderam construira um moinho e uma bodega. Por exercer liderança na localidade, Paulo Bortoluzzi é considerado o fundador de Vale Vêneto.
Com a chegada de novos imigrantes a comunidade sentiu necessidade da troca do nome, nesse sentido Barrinuevo (sld):
"Após muitas brigas, o então Padre sório que veio da Itália, a pedido das famílias para exercer no local as funções clericais, fez uma reunião com os imigrantes afim de mudar o nome. No dia 8 de dezembro de 1881, foi proposto o nome de “Val Vêneta”, argumentando que todos estariam vivendo num bonito vale, com clima mais ou menos parecido com o da região de origem dos imigrantes, ficaria então Val Vêneta."
Entretanto, por ocasião da visita do Bispo de Porto Alegre no ano de 1909, foi sugerido que o nome fosse passado para o português, portanto, Vale Vêneto. Concordaram todos e, assim chama-se esta localidade atualmente.
Fazem parte da história de Vale Vêneto a Igreja de Corpus Christi, construída no início do século passado, o Ginásio Nossa Senhora de Lourdes, pertencente as irmãs do Imaculado Coração de Maria que funcionava como internato. Hoje, o colégio aluga algumas dependências para a Secretaria de Educação do Estado, onde funciona o Ensino Fundamental. Merece destaque o Calvário que foi criado em 1913 com as 14 estações, que contam o Martírio de Jesus Cristo e a Gruta Nossa Senhora de Lourdes, que nasceu de uma promessa feita pelo Padre Pedro Bottari, em 1941, em virtude das fortes chuvas que provocaram o desmoronamento de terras e rochas.
Também há o museu Histórico de Vale Vêneto que é considerado o maior acervo histórico e cultural Italiano do Rio Grande do Sul. Recebeu o nome do Padre João Iop e foi fundado em 1975, por Eduardo Marcuzzo, por ocasião do Centenário de Colonização Italiana no Estado. Guarda um acervo de mais de três mil peças, mostrando objetos de Lavoura, móveis da época, roupas e outros. Esse material foi doado e é mantido pela Associação Cultural do Imigrante.
Angelo Paschoalin morre em Vale Veneto em 03 de Dezembro de 1923. Daquele período até hoje seus descendentes tiveram algumas deturpações de seu sobrenome original passando de Paschoalin para Pasqualin, Pasqualini.

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